Nossa sociedade está doente, isso não é segredo mais para ninguém. Após anos levando a cabo ideologias que prometiam libertar o homem das suas amarradas religiosas, como Nietzsche, Freud, Karl Marx e seus seguidores se propuseram a fazer, atingimos o resultado desse nefasto e previsível atentado aos principais fundamentos da espiritualidade humana -adoecemos brutalmente!
O escritor Russell Kirk advertia que esses ideólogos corrompiam os símbolos da transcendência, da salvação pela graça e da vida após a morte, com falsas promessas de uma vida plena e perfeita nesse reino terreno. O que a religião, especialmente a cristã, oferecia na esfera metafísica, as ideologias ofereciam na esfera material, transformando sua própria doutrina numa “religião invertida”.
Ao “matar Deus” o homem perdeu seu absoluto, a noção de transcendência que sempre esteve presente dentro de si, e passou a divinizar coisas materiais, como dinheiro, sexo e o trabalho. Não que essas coisas sejam ruins em si, mas como afirma o bispo Fulton Sheen, em Angústia e Paz:
“Uma vez perdido Deus, perdem os homens a finalidade da vida e quando se esquece a finalidade da vida, torna-se o universo sem significação. Tenta então o homem esquecer seu vazio pela intensidade da experiência do momento.“
O mundo se tornou cada vez mais secular e materialista ao longo do tempo. O capitalismo melhorou a vida de milhões de pessoas, isso é fato. Após a revolução industrial, com a maior oferta de alimento a população, a taxa de natalidade aumentou e a vida começou aos poucos a melhorar. A crença no progresso foi inevitável.
Com o passar dos séculos a vida melhorou consideravelmente, e hoje temos melhor qualidade de vida e acesso a coisas que nem os mais poderosos reis já tiveram. As dificuldades da vida diminuíram consideravelmente, fazendo o ser humano focar em se deleitar nos prazeres que a vida proporciona de modo puramente hedonista. Antes preocupava-se em qual seria sua próxima refeição, como a obteria, se teria um teto sobre sua cabeça. Hoje as preocupações são com coisas muito mais superficiais, se comparada as necessidades urgentes de tempos mais remotos. Isso me faz lembrar o provérbio bíblico: “não me dês nem a pobreza nem a riqueza; mantém-me do pão da minha porção de costume; Para que, porventura, estando farto não te negue, e venha a dizer: Quem é o Senhor? ou que, empobrecendo, não venha a furtar, e tome o nome de Deus em vão.” (Pv 30.8,9)
A crença no progresso junto com as ideologias que daí surgiram foram afastando o homem de Deus, e ao se esvaziar da presença divina, o homem buscou se preencher com outras coisas na busca pela felicidade. Mas aquilo que não possui raízes, não se mantém de pé por muito tempo. Foi um erro fatal crer que o progresso andava ao lado da felicidade. Sempre foi um erro do ser humano atrelar seu conforto material com a felicidade e a paz da alma.
Hoje, com apenas um “clique” pedimos todo tipo de comida, somos transportados de um lugar ao outro, nos comunicamos com gente do outro lado do mundo, aprendemos sobre qualquer coisa na internet. Nunca na história do mundo o tivemos um acesso tão fácil ao entretenimento, ao sexo, e a todo tipo de prazer e facilidade que o mundo pode oferecer. Mas nunca na história do mundo o homem se sentiu tão triste, vazio e incompleto. E isso tem gerado consequências drásticas na sociedade.
Segundo dados da Anvisa, o consumo brasileiro do princípio ativo do Rivotril, o clonazepam, em 2007 era de 29 mil caixas por ano. Em 2015, este número atingiu os 23 milhões.
Um estudo de 2015 da OMS (Organização Mundial da Saúde), estimou que mais de 300 milhões de pessoas no mundo tenham depressão, um aumento de 18% comparado ao estudo de 2005. 1http://www.who.int/en/news-room/detail/30-03-2017–depression-let-s-talk-says-who-as-depression-tops-list-of-causes-of-ill-health
Segundo o Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos, o suicídio foi a 10ª principal causa de morte nos Estados Unidos em 2016, tirando a vida de quase 45.000 pessoas, sendo mais que o dobro do número de homicídios (19.362). Sendo os homens as maiores vítimas, com número 3 vezes maior que o das mulheres. E para cada suicídio realizado, há cerca de 25 tentativas 2 https://www.nimh.nih.gov/health/statistics/suicide.shtml
Segundo a OMS, o suicídio é uma das três principais causas de morte entre pessoas de 15 a 44 anos em todo o mundo, e é a causa de quase um milhão de mortes a cada ano em pessoas de todas as idades. 3World Health Organization, The Global Burden of Disease: 2004
No Brasil não é diferente, dados mostram que entre 2011 e 2016, ocorreram 62.804 mortes por suicídio, a maioria (62%) por enforcamento. Os homens concretizaram o ato mais do que as mulheres, correspondendo a 79% do total de óbitos registrados. Sendo o suicídio a quarta causa de morte entre os jovens. 4 http://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/29691-taxa-de-suicidio-e-maior-em-idosos-com-mais-de-70-anos
Sendo que pode ser comum pensar que nos países mais pobres a taxa de suicídio é maior devido às dificuldades econômicas. Mas essa regra não se aplica. Derrubando o mito popular, dinheiro e felicidade não andam juntos.
Em relatórios recentes, a Coréia do Sul, Bélgica e França possuem uma taxa de suicídio por 100 mil habitantes maior do que Serra Leoa, Laos e Camboja, países que se encontram entre os mais pobres do mundo. 5 http://worldpopulationreview.com/countries/suicide-rate-by-country/
Esses dados são assustadores e mostram que ao contrário da expectativa materialista, o progresso tecnológico e o aumento na qualidade de vida não trouxe a felicidade esperada.
Nós temos vivido como se a civilização, a cultura e o bem-estar fossem produtos apenas de atividades econômicas, e não ao contrário. A economia, a civilização e a cultura precisam estar subordinadas a valores morais e espirituais sólidos, senão morrerá. Como nos apresenta em seu estudo o antropólogo britânico J.D. Unwin, ele estudou oitenta e seis culturas civilizadas e incivilizadas, abrangendo um período de cinco mil anos e encontrou que as culturas mais prósperas eram aquelas que mantinham uma forte ética matrimonial. 6Joseph Daniel Unwin, Sex and Culture (London: Oxford University Press, 1934).
E o historiador Arnold Toynbee revela nas suas pesquisas que, das 21 civilizações que desapareceram, 16 se extinguiram em decadência da virtude interior. 7Arnold J. Toynbee, A Study of History
Se analisarmos os dados e compararmos com a sociedade de hoje, o que vemos? Que com certeza não iremos durar muito! O relativismo moral que o mundo moderno está mergulhando será uma experiência derradeira na história, poderá ser sua primeira e única tentativa.
Todas essas taxas alarmantes de suicídio, depressão e consumo de remédios ansiolíticos são o grito desesperado de socorro de uma sociedade que está afundando em sua própria cegueira espiritual. Quem leu o livro Admirável mundo novo, do Aldous Huxley, lembra da droga SOMA que era consumida pelos personagens para que nunca ficassem tristes, e como eles eram constantemente incentivados a estar numa busca desenfreada por prazeres sem propósitos para preencher o grande vazio que eles sentiam. Não estamos longe disso.
O afastamento de Deus foi um afastamento de si mesmo. Tudo que chamamos de história humana, é a terrível e longa tentativa do homem de descobrir a felicidade em outra coisa que não Deus. Impérios já surgiram, classes dominaram, revoluções aconteceram, guerras destruíram, acordos foram firmados, mas algo sempre deu errado.
Por quê? Por que a tão sonhada felicidade não chegou se vivemos os “tempos áureos” do progresso e tecnologia?
C.S Lewis faz uma interessante analogia: “A razão pela qual essa tentativa não pode ser bem-sucedida é a seguinte: Deus nos criou como um homem inventa uma máquina. Um carro é feito para ser movido a gasolina. Deus concebeu a máquina humana para ser movida por ele mesmo. O próprio Deus é o combustível que nosso espírito deve queimar, ou o alimento do qual deve se alimentar. Não existe outro combustível, outro alimento. Esse é o motivo pelo qual não podemos pedir que Deus nos faça felizes e ao mesmo tempo não dar a mínima para a religião. Deus não pode nos dar uma paz e uma felicidade distintas dele mesmo, porque fora dele elas não se encontram. Tal coisa não existe.” 8C.S Lewis, Cristianismo Puro e Simples, p.44
A verdadeira felicidade só pode vir de algo absoluto, transcendente e fonte de todo bem, Deus. Como diz Santo Agostinho em suas Confissões: ” fizeste-nos para ti, e inquieto está o nosso coração, enquanto não repousar em ti.” 9Santo Agostinho, Confissões, p. 18
O mundo que rejeita a Luz terminará no abismo das trevas. Deus como fonte de todo Bem, é fonte de toda felicidade. O mundo caminha a passos largos para sua própria destruição, mas aquele que entende que sua plenitude transcende esse mundo, e que o sentido da história só pode estar em quem a criou, sofrerá muito menos dessas mazelas. Deus é o princípio e o fim do propósito da existência humana, por Ele fomos criados e para Ele viveremos e somente Nele encontraremos descanso.